prefácio

Os poemas de Sumi-ê, de Nydia Bonetti, inventam um jardim, que não é o zen japonês, mas tentam simulá-lo, com seu rigor de pedras. Surgem, aqui e acolá, uma rosa, um lírio, ou um girassol. O restante são “flor”, assim como as árvores são uma “árvore” inominada, a representação da arvoridade, ou seja, sua essência. A impessoalidade deve-se  à tentativa de ser fiel  à técnica do sumi-ê:  com poucos e breves traços desenhar um objeto.
Os aquarelistas japoneses buscam captar a essência de um objeto através das pinceladas rápidas.  A técnica para obter essa essência não é delinear o objeto e sim captar seu “espírito” ou seu vazio.
Com poemas que “não dizem nada”, Nydia quer se aproximar deste vazio. Vazio por vezes confundido com melancolia, mas em que ressoa o mono no aware, tristeza que vem da consciência da transitoriedade da vida.
Ao tomar consciência desta transitoriedade, o mujo, a poeta se esforça para imitá-la e fazer o espírito transcender a paisagem ilusória do mundo. Contemplar a natureza é um meio de chegar à essência da natureza humana.
Nydia é uma admiradora das artes japonesas. Por isto busca aproximar sua poética dos conceitos do haiku.  A ideia não é seguir à risca as regras da poesia tradicional japonesa, mas apreender seu clima sem sentimentalismos.
O tema da flor poderia conduzir ao equívoco de que se trata de uma poesia romântica, que segue uma tradição simbolista. Uma menção à “flor azul” faz lembrar Novalis  mas não é nada disto. Neste Sumi-ê,  seguimos a poeta em sua tentativa de desenhar A Flor. Para ela, aparentemente, esta tentativa se frustra. Para nós, leitores, a rota apresenta sua delicada e intensa paixão.


Marilia Kubota